Capítulo 12, Marcas

12
Março, 2008.
   E um ano se passou desde o dia do show, era o nosso aniversário de namoro. E não, nada mudou. Continuávamos apaixonados como sempre, parecia que a cada dia quando eu acordava, um anjo, duende, fada, gnomo, enfim, colocava um pouco mais de amor por Victor dentro de mim. As poucas brigas que tivemos duravam pouco tempo, e eram sempre resolvidas através de conversas amenas. Eu já havia jantado na casa dos Mansfield algumas vezes, e realmente a casa deles era enorme e tinha um ar todo moderno, mas não deixando as coisas antigas de lado, como no jardim. Eu havia ido a alguns encontros de família dele também. Conheci seus primos, tios e avós, e gostei muito deles, acho que eles também gostaram de mim. Victor ia sempre que podia em minha casa, ele gostava da minha família, e a minha pequena família também adorava a presença de Victor na casa. John estava ótimo no violão, algumas vezes nós nos reuníamos na minha casa pra tocar, eu, Victor e John.
   Victor havia passado no vestibular de arquitetura, e fazia uma semana que ele tentava me convencer de ir a festa dos calouros da universidade. Nunca gostei muito de festas desse tipo, Victor também não, mas como era uma data especial e ele queria conhecer seus novos colegas, ele queria muito ir. A festa aconteceria em uma boate, e além dos calouros iriam outros universitários e convidados. Agora só me restava decidir se eu iria ou não.
   Acordei cedo, e a primeira coisa que me veio a mente foi o fato de ser nosso aniversário de namoro. Era dia de semana, portanto, eu tinha aula. Me levantei, e como de rotina, fui me arrumar. Contava os minutos pra hora de ver Victor e entregar o presente que comprei pra ele. Comprei uma linda jaqueta de couro que ele tanto queria pra andar de moto nos dias de frio e pus uma foto nossa dentro, com um cartão escrito “Te amo tanto quanto o infinito, e tenho certeza que esse será o tempo que o nosso amor prevalecerá, infinito.”
    Tomei um banho, mas não lavei os cabelos. Pus a camiseta do uniforme, minha calça rasgada e minha sapatilha de Spike preta, aquela do primeiro encontro. Me maquiei, basicamente como sempre, penteei os cabelos e os amarrei em um rabo de cavalo alto. Tomei um suco, comi uns biscoitos, conversei um pouco com a mamãe, escovei os dentes e fui pra escola, ouvindo músicas que nem eu acreditava que ouviria um dia. Músicas extremamente românticas e que me retratavam o rosto de Victor, e as mãos dele se entrelaçando nas minhas, o nosso primeiro encontro. Sorri com a sensação de que poderia sim, viver aquilo tudo de novo. Quando cheguei na escola, Anna e Liza estavam no portão. Obviamente que eu não consegui disfarçar a minha felicidade. Elas sabiam que era meu aniversário de namoro, por isso já me esperaram com um sorriso enorme no rosto.
   -Oh lá, está toda feliz. – Anna comentou.
   -Bom dia meninas! – Eu exclamei mais sorridente do que nunca.
    -Parabéns amiga! Um ano de namoro hoje. – Liza disse contente. Ela já namorava fazia 3 anos, então, se tinha uma coisa que ela entendia era sobre namoro. – Nossa, parece que foi ontem que eu te falei do atendente bonito da loja de música.
    -Obrigado! Nossa, estou tão feliz, estou louca pra entregar meu presente a Victor.
   -Ai que meigo, estou vomitando arco-íris aqui. – Daniel surgiu por trás de mim, irônico como sempre, me fez lembra de John. Ele pôs seu boné na minha cabeça sorrindo. – Vamos pra sala três patetas, daqui a pouco a professora entra na sala.
   -Daniel, para de ser estraga prazeres! – Falei rindo, devolvendo o boné a ele e arrumando meus cabelos.
    Entramos na sala de aula e sentamos nos mesmos lugares de sempre. Os três primeiros períodos foram de espanhol e física. Fizemos exercícios em ambos. Não me considero um ótima aluna, mas as minhas notas não são nada ruins, e eu nunca fiquei em recuperação. Victor costumava me chamar de CDF por causa disso. No recreio, ficamos em rodinha jogando conversa fora, e rindo pra valer. Voltamos do recreio e tivemos uns 15 minutos de aula de história, até que alguém bateu na porta. Meu professor atendeu.
    -É aqui que estuda a Natalie Lewis – Disse um moço com um buquê lindo e enorme de rosas vermelhas nas mãos. Minha primeira reação foi ficar sem reação.
    -É aqui sim, ali está ela. – Disse meu professor apontando pra mim.
    O moço veio em minha direção, eu me levantei e fiquei ao lado da minha mesa. A turma estava chocada. Em um relapso olhei pra eles. As meninas estavam com uma expressão de simpatia, como se estivessem achando tudo muito lindo. Os meninos estavam meio apavorados, afinal, acho que ninguém ali teria coragem de fazer uma coisa dessas no aniversário de namoro. O moço me entregou o buquê, e um pacote de presente, e uma caixinha vermelha com um envelope de cartão em cima. Uma lágrima escorregou em meus olhos, sorrindo, imaginei Victor preparando tudo isso as escondidas.
    -Entrega pra você. – Disse o moço.
    -Muito obrigado. – Falei sorrindo.
    Quando o moço virou as costas, a turma toda começou a implorar para que eu abrisse o presente e lesse o cartão em voz alta. Eu tentei resistir, mas eles eram insistentes, então não tive escolha a não ser fazer o que eles pediam. Enxuguei as lágrimas que escorriam, deixei o buquê em cima da mesa e pus-me a abrir o pacote. Lá dentro estava o único livro do Nicholas Sparks que eu ainda não tinha, e uma girafa de pelúcia. Eu achei aquilo tão lindo, e foi a prova de que ele prestava atenção em tudo o que eu falava, afinal, eu havia dito diversas vezes que amava girafas. O que eu achei engraçado foi que eu nunca comentei que faltava aquele livro pra eu ter a coleção completa. A turma inteira exclamou um “awn” em coro, até meu professor que era muito descontraído. Deixei os presentes na mesa e abri primeiro a caixinha. Lá dentro havia um quindim em uma forminha linda, e logo me veio a mente o nosso terceiro dia de conversa, quando ele me levou em casa depois do serviço, que eu disse à ele que meu doce favorito era quindim. Eu mostrei pra turma e todos ficaram com água na boca, menos aqueles que não gostavam do doce. Abri o cartão, e li em voz alta.
   “Te amo desde a primeira vez que te vi, e vou te amar até o momento em que fechar meus olhos na morte. Espero ter alegrado a sua manhã nesse nosso um ano de namoro, que é só o início de uma longa jornada juntos. P.S: Coma o quindim, lembrando do meu beijo. Assinado: Seu eterno namorado, Victor Mansfield”
   A parte do quindim eu não li em voz alta, acho que era algo particular demais pra turma ficar sabendo. Eu chorava de alegria, a turma bateu palmas e me parabenizou pelo namorado romântico. Agradeci e me sentei, tentando me recuperar. Victor era demais. Muitas vezes me perguntei se não estava sonhando, e só tive certeza que não quando a aula voltou ao normal. A aula, não eu. Eu não conseguia desligar meu pensamento de Victor, ficava imaginando ele planejando tudo, e como eu fui idiota a ponto de não desconfiar de nada. A aula terminou, eu guardei os presentes na mochila, e levei o buquê até em casa nas mãos. No caminho, percebi as pessoas a minha volta me olharem constantemente, graças ao lindo buquê que eu carregava nas mãos.
   Cheguei em casa, mamãe e John já estavam na mesa.
   -Querida, que lindas as flores! Victor tem bom gosto.
   -Pois é, ele é... Perfeito.
   Larguei as flores, e me juntei a eles. John estava quieto, estranhamente quieto. Estava com a cabeça baixa, mexendo na comida ao invés de comê-la.
   -John, você está bem?
   Ele não respondeu de primeira. Mamãe ficou preocupada, ela tentava examinar John.
   -Mano? Você está bem? – Falei em um tom mais alto, mais preocupada ainda.
   -Ah, desculpa, só estava distraído. Estou bem sim.
   Ele estava com um olhar triste, sabia que havia acontecido alguma coisa. Lembrei-me da promessa que fiz a mim mesma quando papai morreu, que pra sempre iria cuidar de John, nunca deixaria alguém magoá-lo, porque crescer sem o pai por perto já era doloroso o suficiente, e eu sabia disso melhor do que ninguém.
   -Não parece. Aconteceu alguma coisa pra você estar assim? Pode confiar em mim.
   -Não aconteceu nada mana, é sério.
   Podia detectar a mentira de longe, mas não quis insistir no assunto, se ele não queria contar agora é porque não se sentia a vontade.
   -Tudo bem, vou acreditar em você.
   Minha mãe estava preocupada, mas não quis falar nada, ela sabia que se John não contou a mim, a ela é que ele não ia contar. John sempre foi mais apegado a mim, nas noites em que ele chorava porque sentia saudades do papai, quem ficava do seu lado era eu, porque a mamãe não estava em condições emocionais de fazê-lo. Eu o abraçava, e dizia que ia ficar tudo bem, mesmo quando parecia difícil acreditar.
   O almoço foi silencioso, tanto eu quanto mamãe estávamos intrigadas quanto a expressão de John, e o olhávamos constantemente pra ver o que estava acontecendo, mas ele não nos revelara nada.
   Depois de almoçar, fui me arrumar para ir trabalhar. Tirei a camiseta do colégio, e pus uma regata branca, com um casaquinho leve preto. Escovei os dentes, peguei o presente de Victor e saí em direção a porta. Mais uma vez vi John sozinho na sala em silêncio.
   -John, tem alguma coisa errada. O que está acontecendo?
   -Nat, não foi nada está bem? Fica tranquila.
   -Não dá pra ficar tranquila te vendo desse jeito.
   -Nat, eu só não dormi muito bem hoje.
   -Eu quero acreditar em você, mas não consigo.
   -Pode ir trabalhar, eu estou bem.
   -Eu vou, mas qualquer coisa me liga tudo bem?
   -Tudo bem.
   -Beijo, vou indo.
   -Beijo Nat.
   Fui pra loja ainda preocupada. John não estava bem, e isso não me deixava ficar bem. Caminhei em passadas largas, tentando imaginar o que se passava na cabeça do meu irmão. Não cheguei a conclusão nenhuma.
   Cheguei na loja, Victor já estava lá. Forcei um sorriso.
   -Oi minha linda. – Ele disse se aproximando, e me dando um leve beijo nos lábios.
   -Oi meu amor, muito obrigado pelos presentes. Amei todos eles, você é um anjo, não precisava ter gastado tanto comigo. Fiquei muito surpresa quando o moço me entregou as flores, e feliz, muito feliz.
   -Pedi pro moço me descrever a sua expressão quando recebeu os presentes, ele disse que você chorou.
   -Que fofoqueiro! – Levei uma das mãos a cintura, erguendo uma das sobrancelhas. - mas é verdade. Te amo muito viu? E obrigado por me aguentar por um ano, e te peço, me aguenta por mais uma eternidade por favor.
   -Não precisa nem pedir, eu te aguento sem esforço nenhum.
   -Bobo.
   -Mas, essa sua carinha não me diz que você está feliz não. Aconteceu alguma coisa?
   -Estou preocupada com o John, ele estava entristecido hoje, mas não quis me contar o que aconteceu.
   Ele me abraçou.
   -Amor... Não fica assim, pode ser que seja uma coisa de garoto, que ele não queira falar. Pode ser que ele esteja apaixonado. É normal na idade dele.
   -Não sei Victor, ele estava muito estranho.
   -Fica tranquila, pode ser que ele apenas quisesse ficar um pouco na dele.
   -Tomara. Você sempre me tranquiliza sabia?
   -Que bom poder fazer por você o que você faz por mim sempre.
   -Te amo mais ainda.
   -Eu também te amo.
   -Ah, está aqui seu presente. Feliz um ano de namoro meu amor.
   -Minha princesa, não precisava.
   -Abre.
   Ele abriu o pacote e tirou primeiro a foto e o cartão. Ele sorriu instantaneamente, e me beijou repentinamente. Um beijo longo que tranquilizou o que ainda não estava tranquilizado em meu coração. Depois ele tirou a jaqueta.
   -Amor que linda! – Ele a vestiu. – Ela é muito linda mesmo, muito obrigado.
   -De nada meu lindo, sabia que você ia gostar. Você foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida sabia?
   -Sabia. E sabe do que mais eu sabia?
   -O que?
   -Que eu não sei viver sem você.
   Eu o abracei por cima do pescoço rapidamente, e ficamos abraçados uns cinco minutos. Depois nós abrimos a porta da loja. O dia foi bastante movimentado, tocamos pouco, porque era muita gente pra atender. Parece que todas as peças de todos os instrumentos da cidade resolveram estragar naquele dia. Quando terminamos o expediente Victor fechou a loja.
   -Então minha princesa, posso passar na sua casa mais tarde pra te buscar para um programa especial?
   -Hum, programa especial é? – Eu falei sorrindo.
   -É. – Ele falou com aquele sorriso moleque se sempre.
   -E que programa é esse?
   -Surpresa.
   -Mais surpresas? Caramba, você está me saindo melhor do que a encomenda.
   -Vou ter que te levar de moto hoje linda, porque eu tenho que preparar umas coisas pro nosso programa especial.
   -Tudo bem então. – Minha curiosidade estava me matando, amava surpresas, mas odiava não saber o que era. Estranho isso não?
   Ele me alcançou o capacete e me levou pra casa. Quando cheguei na frente do portão, desci da moto.
   -Passo aqui daqui a meia hora pode ser?
   -Tudo bem, vou me arrumar rapidão.
   Nos despedimos e eu entrei em casa.  Mamãe estava lendo uma revista na sala, nos cumprimentamos e eu nem perguntei por John porque eu sabia que essa era a hora que ele costumava brincar com os amigos. Entrei no quarto e tive uma grande idéia, coloquei a mesma roupa do primeiro encontro na praia, e é claro, o batom vermelho. Em meia hora estava pronta, esperando Victor chegar. Estava muito curiosa pra saber o que ele havia preparado, cogitei várias possibilidades, mas parece que nenhuma era cabível. Quando ele chegou, meu coração palpitou como na primeira vez que nos vimos, minhas mãos suavam frio e eu tinha aquela sensação esquisita de que tinham borboletas no meu estomago, era engraçado me sentir assim depois de um ano de namoro. Saí correndo pela porta, me despedindo da mamãe. 

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